domingo, 27 de julho de 2014

CAP.1: O VOTO.




PRÓLOGO. 

Minha conversão ao evangelho veio ligada definitivamente  à um  compromisso missionário. 

Foi uma ligação genética igual acontece com gêmeos siameses, que dividem órgãos vitais dos quais não há nenhuma possibilidades de separação, porque, cada um, por sua vez,  depende do mesmo órgão ao qual estão interligados para garantir a vida.

Por isso, para muitos que me conhecem desde o tempo da  juventude e percebem o meu empenho e envolvimento com missões, e observam o meu combate contra a omissão que as vezes chega até incomodar, pela repetição e insistência em um assunto que a maioria dos cristãos e principalmente os obreiros que dividem os valores arrecadados,  desejam evitar a todo custo. E quem não conhece como tudo começou jamais vai entender porque insisto no combate.

Fio por isso que eu decidi escrever para explicar isso com todos os seus detalhes, e assim todos poderão entender  de forma explicita, como tudo aconteceu, e até onde chegou a minha descoberta sobre a missão da igreja. 

Primeiro quero esclarecer que minha chamada não foi de uma forma totalmente voluntária, mas, uma espécie de rendição, que felizmente aconteceu depois de estar insistindo em andar pelo caminho errado. 

Porém, em minha decisão de render-me definitivamente ao Senhor e seu domínio,  fiquei ligado de forma vitalícia com as missões que nenhuma cirurgia pode separar-nos. E podem crer que já passei por alguns momentos difíceis, vivendo processos internos e externos frustrantes que na fragilidade do momento tentei fazer esta separação, sem nunca obter sucesso.

Deus, porém, tem os seus métodos para fazer impedir que alguém designado fuja de sua missão. Basta ver o que aconteceu com Jonas. 


Aqui neste livro não quero apenas contar-lhes minha História,  para que vocês entendam como tudo aconteceu, eu desejo também meus leitores, aprendam o que aprendi estando nos campos,  atuando no Exterior, e percebam o que eu percebi sobre a ação missionária da igreja do ângulo que estou. 

Creio que a igreja que não saiu, precisa  entender sobre o caminho trilhado pelos cristãos que saíram para cumprir o Ide, porque somente assim, o crescimento vertical da igreja, onde são gerados os recursos, poderá tomar consciência de servir de base de sustentação para o crescimento horizontal, que vai realizar a conquista dos confins da terra com para chegar a toda  criatura que esta incluída no plano de salvação.

Quando me converti, meu primeiro envolvimento com missões foi local e regional, meu primeiro campo de trabalho foi um vilarejo de pescadores chamado Caju-Una,  localizado na ilha do Marajó, à margem do Oceano Atlantico, ao Norte do Brasil,  depois nacional, quando fundamos o Sistema Mundial de Missões, (Worldwide Missions) já morando em Brasilia, em 1985,   e finalmente  além fronteiras, quando passei atuar na esfera internacional, plantando igrejas em outras Nações, a partir do Estados Unidos, formando obreiros através do SEMIPAN, que é o Seminário Missiológico Pan Americano, lançado desde 2014 em Nova Iorque,    e sustentando obreiros e incentivando obreiros e ministérios para fazer missões, através do projeto missionário Igreja Para Todas as Nações (All Nations Church Ministries), um trabalho desbravador que  está  desenvolvendo-se pela Africa. Temos sustentado obreiros para fazer a obra, formado igrejas, batizados pessoas, ajudado refugiados de guerras a serem removidos  da área de conflitos

Nossa missão e seus apoiadores tem ajudado com cirurgias, compra de alimentos, construção de locais de cultos, e um audacioso movimento de sustentação evangelista que esta evangelizando e batizando pessoas que estão se convertendo do islamismo ao cristianismo, e eles chegam com uma força e desejo de trabalhar na evangelização que vale a pena ver e sentir. Diferente de outros cristão que apenas desejam as benesses do evangelho. Os muçulmanos quando se convertem, trazem para o cristianismo o seu compromisso de produzir resultados, igual Paulo, quando se converteu do farisaísmo ao cristianismo, que de perseguidor passou a ser perseguido por causa do evangelho. 

Mas, isso não aconteceu rápido, foi acontecendo de forma gradativa, progressiva, etapa por etapa, degrau por degrau. Em um processo que se tornou muito mais lento, devido exatamente outros tipos de trabalhos foi necessário fazer, como milhares de horas gastas em trabalhos seculares de sustento, houve muito tempo e energias gastos com formação de empresas o que foi necessário ser feito de forma paralela para garantir o sustento nos campos. Como teria sido mais fácil e produtivo, no mundo inteiro se o tempo dos missionários e missionarias que existem fora se de seus  países, com um propósito missionário, fossem consumidos integralmente na obra, porém, infelizmente a omissão missionária que consume os recursos das missões para outros fins, não permite isso.

Aqui quero que todos tenham uma visão das lutas enfrentadas nos campos, e vejam também os milagres da provisão de Deus, ao longo dos anos, porque certamente há experiências valiosas para quem ama a causa do Mestre, que está comprometido, ou deseja comprometer-se com a salvação dos perdidos da terra. Quero incentivar os que temem sair por causa dos bloqueios que veem existir em seus termos, e da falta de apoio que percebem,  que mesmo, com todo este aparelhamento contra as missões, mesmo assim vale a pena confiar, vale a pena sair pela fé, que uma vez foi entregue aos santos, e saiba santo e saiba, a palavra santo vem de um vocábulo grego, que significa separado. 

Aqui vocês vão conhecer a  minha entrega para realizar missões sem medir as consequências para mim mesmo e para minha família, e verão hoje, que não estou arrependido, pois Deus é Fiel. 

Se alguém me perguntar quais são os três caraterísticas   básicas que deve possuir o cristão  no momento de  atender um chamado missionário, eu lhe direi como resposta; Renúncia, Entrega e Persistência. Sem isso torna-se impossível, superar todas as barreiras iniciais e as que permanecem, enquanto durar a omissão missionária gerada e sustentada pelo sistema eclesiástico atual que rege o cristianismo no mundo, com suas preciosas e raras exceções, que são os justamente os pastores, igrejas  e ministérios comprometidos com as missões.  

Também, vou mostrar as razões de meu empenho e dedicação em combater a omissão missionária de nossos dias, para derrubar as barreiras internas e externas que existem contra obra missionária mundial. 

Meu propósito neste livro é para que no futuro os novos missionários que sentirem o mesmo desejo que eu senti,  e fizerem o mesmo compromisso que eu fiz, encontrem o caminho livre, desobstruído,  para que tenham a chance de sofrer menos e possam produzir muito mais no que eles têm à fazer. Creio, conforme os sinais de nosso tempo, que a  nova geração de missionários que está surgindo, serão os trabalhadores da undécima hora,  serão eles que vão  poder completar  a obra de evangelização do mundo que ainda está longe de ser terminada, por incompetência  da liderança religiosa de  nossa geração que preferiu o ter e desprezou o ser. 

As consequência da lerdeza missionária de nossos dias, o que alguns  pastores locais chamam de "desaceleração missionária"  que com esse nome tem  fácil compreensão no fator ilustrativo, no entanto, diminui a gravidade do assunto, e talvez vise ocultar as consequências reais da omissão missionária dentro e fora da igreja.

Também oculta as coisas que estão acontecendo com a própria igreja, como  a sua  ultrapassagem por outras seitas e doutrinas que oferecem frontal oposição ao cristianismo e estão avançando na dianteira da igreja na conquistas dos povos e territórios da terra. A igreja, com a mensagem que tem a entregar, com o poder delegado que dispõe à seu favor para fazer isso,  tendo o próprio Espirito Santo como aliado, e a promessa do próprio Jesus de estar presente com ela até a consumação dos séculos, jamais deveria estar na situação em que se encontra no mundo. É injustificável, que o islamismo, que surgiu no mundo há 610 anos depois da igreja, agora  esteja na frente na conquista de povos e territórios. 

Qual o segredo dos muçulmanos? Eles creem no que pregam. Eles investem em seus missionários. Ele protegem os seus territórios, e avançam para conquistar as nações, em uma luta sem trégua. Enquanto nós falamos em conquistar o mundo, eles estão determinado em dominar o mundo. 

CAPÍTULO UM: O VOTO.

Mas, deixem-me começar dizendo como como foi meu envolvimento com missões, ou melhor, a minha rendição e entrega aos propósitos de Deus para a minha vida. 

Minha conversão ao evangelho, se deu quando eu tinha 17 anos de idade,  e isto não aconteceu em um ambiente agradável, mas, dentro de uma prisão fedorenta. 

Lembro-me que no ambiente em que estava  tinha percevejos que se alimentavam do sangue dos prisioneiros que dormiam pelo chão, sem nenhuma condição de higiene, ali estavam pessoas que tinham a reprovação da sociedade e nem sequer tinham o respeito e a consideração dos seus pares que estavam sob as mesmas circunstâncias e condições. 

Eu ainda estava muito jovem totalmente inexperiente para enfrentar os desafios da vida e talvez por este fato,  desde os primeiros momentos em que era conduzido energicamente sob as ordens do delegado de plantão para dentro daquele prédio  antigo, com paredes grossas feita de pedras,  mal iluminado,  o meu coração batia acelerado observando cada detalhe que eu via, ouvia e sentia naquele naquele lugar. Tudo era impactante, cruel, desumano. E o pior; eu estava sendo preso totalmente inocente.

O primeiro ponto é que eles estavam cometendo um erro muito grave contra um jovem que na verdade não era um santo,  mas, que estava sendo acusado de forma injusta, mentirosa, parecia um sonho, ou pior, um pesadelo, mas, no entanto tudo ali era profundamente chocante e real, infelizmente eu não estava sonhando ou tendo pesadelos, dos quais eu poderia acordar sã e salvo, ali eu estava vivendo o fato, a cada minuto e na própria pele.

Enquanto o policial me conduzia pelos corredores para a triagem onde deixaria meus documentos e objetos pessoais, para ser conduzido à cela, eu tentava lhe explicar que estavam cometendo uma injustiça, e prendendo a pessoa errada, mas, isso de nada adiantava, ele  havia recebido ordens superiores para me trancafiar nas grades isso estava fazendo, normalmente, como fazia à qualquer um que lhe fosse entregue. Quando o delegado pediu-lhe que me conduzisse ao xadrez, ele imediatamente para mostrar diligencia, agarrou-me por traz pela cintura, segurando-me
com força pelo cinturão. Ele também era forte e tinha um revolver de um lado e um cassetete no outro. 

Parece que aquele homem já estava acostumado a ouvir reclamação de cada preso que conduzia sem nada responder, porém, para mim ele ainda teve a gentileza de responder-me, disse-me apenas que estava cumprindo a sua função, e eu até que compreendia isso.

Eu penso  que por aquele carcereiro  ter notado pelo meu aspecto de jovialidade e a conversa firme que mantinha, que eu estava sendo sincero, e prometeu que iria colocar-me em uma cela melhor, mas, enquanto caminhava para o lugar onde teria que deixar meus pertences, ou seja minha carteira com dinheiro e documentos,  e a camisa de trabalho que eu estava usando, pois teria que ficar sem camisa. No Norte do Brasil o clima é muito quente e úmido, a nas prisões, não tem ar condicionado, e quanto menos roupa o prisioneiro vestir melhor será para ele mesmo, não sentir tanto calor.

O carcereiro  me explicou que aquele benefício de me colocar numa cela melhor, com pessoas menos perigosas, estava condicionado em eu lhe deixar algum valor que tinha em meus bolsos, que ele fez questão de saber quanto era que eu tinha disponível para dar-lhe pelo favor.

Lembro-me bem que eu tinha apenas 34 cruzeiros, e algumas moedas, que lhe entreguei da forma como ele pediu, disfarçadamente enquanto ele guardava minha camisa e carteira com documentos em um pequeno armário, situado no corredor que levava ao local das celas. 

Imaginem que se a corrupção corre solta nos gabinetes  de  alguns legisladores e  governantes inescrupulosos, então avalie o que pode acontecer no corredor de uma cadeia, com quem lida diariamente com bandidos. Gente boa e gente má existe em toda parte, e tocou-me a mim, ser conduzido por um policial bandido, digo isto porque ele fez o que não devia fazer, por dinheiro, e fazendo,  e não cumpriu o que prometeu, foi somente uma desculpa para pegar o meu dinheiro.

Eu estava na Central de Polícia em Belém do Pará, no Norte no Brasil. Todos os presos até agradecem a exigência de ficarem apenas com roupa interior quando estão dentro das celas, mas, eu não sabia disso e me arrependi de não ter deixado dentro do armário a minha calça jeans que estava usando na hora que entrei no cárcere vestido com ela, deixei apenas a camisa, o cinturão  e a  carteira com os meus  documentos no armário da triagem. 

Assim que a cela se fechou pelo lado de fora e o carcereiro voltou ao seu posto levando consigo o meu suado dinheirinho, eu percebi que estava em uma cela com 17 bandidos da pior periculosidade que havia por aquela região. 

Eu tinha apenas 17 anos de idade, e minha experiência de prisão era zero. Logo veio ao meu encalço, alguém aparentado o dobro da minha idade, e se identificando com o vulgo de Sinal, que segundo percebi, era o líder daquela cela, o mais atrevido e o mais perigoso. 

Depois, mais calmo e refletindo,  avaliei que já havia ouvido e lido a respeito dele anteriormente nos jornais da cidade. O bandido Sinal   era um conhecido assaltante, um latrocida,  que agia na capital do Pará, por aquele tempo.

Mas, no encontro de abordagem, ele foi muito "gentil" comigo, explicou-me falando suave e baixinho ao meu ouvido como se fossemos velhos amigos. 

Ele disse-me que apenas queria que eu me despisse da calça jeans que estava vestindo, e vestisse uma velha e nojenta bermuda que ele entregou-me na mão.

Disse-me que ele precisava de minha calça para troca-la por dez cigarros com um dos carcereiros que era seu 'amigo'. Ele explicou-me que tanto ele como outros presos ali, eram viciados em fumar e a minha roupa era a única forma de conseguirem alimentar o vício naquele dia.  

Notificou-me também  que ali naquela cela eles viviam em comunidade, um ajudando o outro,  e que se eu fizesse isso teria a sua amizade e proteção, caso contrário, ele poderia ficar furioso, e não iria me ajudar-me ou proteger quando fosse necessário. 

Eu como tenho um bom juízo, antes que ele resolvesse pedir outra coisa mais difícil de fazer, rapidamente me despi, e lhe entreguei a roupa que ele queria, uma calça jeans da marca U.S Top nova que eu havia acabado de comprar naqueles dias,  e que certamente chamava atenção em uma prisão em que todos estavam quase desnudos, com suas cuecas ou bermudas envelhecidas, rasgadas e sujas, mas muito sujas mesmos. 

Logo vesti-me com uma bermuda grande de tergal verde que já estava preta de tanta sujeira.  Era uma bermuda era tão grande  para o meu tamanho, que eu tive que dar um nó na frente, na falta de um cinto,  imaginei que estando vestido igual os outros, não haveria mais problemas. Afinal, havia apreendido um velho ditado popular que na terra dos sapos, fique de cócoras e pule igual eles. Pensei que fazendo assim me sentiria tranquilo.

Mas, me  enganei. Na troca de roupa, minha cueca que também ainda estava limpa e nova também chamou atenção de outro detento, e logo ele achegou-se em meu encalço, era um criminoso de uns 45 anos de idade a quem chamavam de Nego Macumba. E ele veio ao meu encontro falando na gíria pesada ao seu estilo, de quem já estava ali há muito tempo, ou pelo menos era costumado a voltar ali, ele disse-me:

- Olha "novinho" eu me engracei com o teu "bico" e sei que você não vai ficar muito tempo aqui, porque o teu caso é leve. Então eu te proponho o seguinte; me entrega o teu "bico" e fica somente com a tua "beca" e tudo fica numa boa.

Realmente eu não entendia o que  ele estava querendo dizer com um palavreado que eu não conhecia,  e com o auxilio do Mãozinha, outro bandido que tinha uma mão mirrada, com quem eu já havia conversado anteriormente, fiquei sabendo que o 'bico' era a cueca, e a 'beca' era a bermuda. 

Logo, então, tirei a minha cueca, a qual o  Nego Macumba, a vestiu contente para substituir o trapo que estava usando,  e cada um foi para o seu lado.  

Mas, a situação para mim naquela cela, não era a pior, pois em nada eu havia resistido e procurava fazer amizade com os outros presos  e mostrar que eu podia adaptar-me rápido à nova situação. 

Quando chegaram na cela os cigarros "comprados" com a minha calça jeans, o Sinal, acendeu 0 primeiro e me entregou para que eu desse as primeiras tragadas, o que fiz de imediato, pois, naquele tempo, fumar era uma das coisas que eu também  gostava de fazer, além de tomar cachaça com limão, e jogar bilhar aos finais de semana nas folgas de meu serviço. Eu trabalhava como cobrador de ônibus. 

Depois, em um momento seguinte chegou ali, não sei de onde, um pirão feito com farinha e caldo de feijão em uma tigela de esmalte, e logo o Sinal, me concede uma colherada, dizendo eu que eu era gente fina, gente boa. Percebi que o meu crédito estava alto no meio da bandidagem, também não era por menos, eu já havia ficado pelado, sem minha calça e até a cueca, e aquela 'beca' que ele estava usando cabia uns dois de mim dentro, dela.  

Na verdade depois descobri, que o tratamento cordial era porque eles tinham medo que eu os denunciasse por eles haverem trocado minha roupa por cigarros. Mas, eu não era idiota a tal ponto de fazer isso, sabendo como funcionava a lei dentro cela.

Neste ínterim, chegou outro preso em nossa cela, era um jovem que foi denunciado e preso quando roubava mercadorias na feira do Ver-O-Peso, sabíamos até que tipo de mercadoria ele tinha roubado, o peixe pirarucu, conhecido como o bacalhau da Amazônia. E quando foram solicitar sua roupa para trocar com cigarros,  ele resistiu, dizendo que não entregaria nada para ninguém.

Logo vi igual uma tropa de choque os outros presos o manietarem enquanto outros batiam batiam nele com força.

Ele começou a gritar e um dos outros presos  tapou  sua boca, enquanto um outro começou a baixar as suas calças na marra, na tentativa de estuprá-lo ali diante de todos. 

Sempre recordo do seu desespero e de seus gritos, dizendo:

"Socorro, estão me "enrabando" aqui. Finalmente os guardas sentinelas, ouviram seus gritos iniciais, e chegaram para impedir que o pior acontecesse retirando o jovem  para uma outro cubículo onde ele ficou sozinho, mas, ele já havia sido machucado com chutes e socos.

Tudo para mim era um aprendizado aterrorizante, mas, eu tentava manter-me calmo para não chamar atenção, nem demostrar medo. Acho que Deus já estava preparando-me para atuar no campo missionário sob toda prova.

Eu comecei a notar que o tratamento, na "comunidade" em que estava era bastante diferente.  

Fora da prisão, eu estava acostumado a ver na hora de uma discursão, chegar a turma do "deixa disso" para tentar impedir o conflito. Naquela prisão, quando vi dois jovens se estranhando por algum motivo, que eu não sabia qual era, vi aproximar-se a turma do "faz logo isso".

A cada hora havia uma discurso  uma desavença  e se  escutava  incentivos tais como: "elimina logo esse cara" ou; "quebra o pescoço dele", "mete uma caneta no ouvido dele quando ele estiver dormindo" ou "manda esse cara morar na cidade dos que tem os pés juntos", - ou "vamos colocar um ponto final nisso" ou; "Vocês são dois homens ou duas Mariquinhas para ficar somente nesse lari lari, a gente quer ver é porrada de verdade"

Ouvi durante a noite, depois de muitas conversas, algumas indecentes aos extremos, outras apenas relatos de proezas inclusive de assaltos e como seus inimigos foram eliminados, havia também planos de como iriam  fazer com os membros das  gangues adversárias.

Quando a conversa findou, tanto a eu quanto os outros presos deitados no chão fétido, principalmente de urina e suor de gente suja,  não podíamos dormir, sem antes matar muitos carrapatos e percevejos, que subiam em nossos corpos para se alimentarem de sangue.

Uns  dormiam sobre algum jornal, ou pedaço de papelão, outros diretamente no cimento frio e úmido, e outros, tinha algum pedaço de pano grosso que os parentes lhe traziam para tornar a noite mais confortável sobre o piso, mas, ninguém tinha colchão. Eu deitado encolhido em algum lugar entre eles, esperava em que lugar do corpo iria atacar no escuro da noite, para tentar mata-lo.

Eu não estava conseguindo dormir, naquele minha primeira e derradeira noite na prisão, eu até que não estava com medo, tem sido assim através dos anos, o perigo sempre me impulsiona, me mostra um desafio que precisa ser vencido,  por algum meio, de alguma forma. Há um dito que diz; "Lance-me aos lobos, que eu voltarei liderando a alcateia" 

Mas, por estar inocente em uma situação daquela, isso  me  incomodava, aqueles presos estava ali por terem cometido crimes, por terem roubado ou matado pessoas, eles se orgulhavam disso em suas conversas,  e eu estava ali apenas, por um aperto de Deus, mas, naquele momento eu nem sabia disso. Se eu ficasse ali, poderia até após passar no  aprendizado que estava tendo, 'liderar a alcateia' mas, jamais, era aquela vida que eu deseja para mim. Aquilo para mim era o próprio inferno, olha que eu ainda não havia visto tudo. 

Observei que Nego Macumba, o que havia pedido a minha cueca, dormia um sono pesado e roncava sobre um pedaço de pano grosso que eu avaliava ser um tapete colocado em forma de colchonete. De repente chegou próximo dele um outro preso que não conheci seu nome o ambiente estava no meio da noite,  e o preso que estava acordado,  pegando nas duas pontas de um mesmo lado do pano onde Nego Macumba dormia, o puxou de uma vez, fazendo que ele rolasse e caísse bruscamente para um um outro lado no piso. E o prisioneiro que fez isso, somente explicou: 

- Quietinho ai, que eu estou precisando disso. 

E o Nego Macumba depois de passar alguns momentos se contorcendo de dor, por acordar bruscamente sendo jogado ao chão, voltou a dormir, desde vez, direto sobre o piso. Observei que ali era a lei do domínio do mais forte, e o mais fraco precisava reconhecer isso  para permanecer vivo. 

No dia seguinte, pela manhã fiquei sabendo que a refeição era pouca, bem racionada e de muito mal gosto, nada que pudesse ser vendido em um restaurante que precisa cativar o freguês, a comida era oferecida apenas uma vez em cada 24 horas, e era servida ao  meio dia.

Durante o almoço, quando todos os outros presos de outras celas ficam juntos, após o banho de sol no pátio, formou-se uma fila  indiana para que cada um fosse servido por sua vez. 

Enquanto eu estava na fila esperando que chegasse minha vez de ser atendido,  percebi, que alguém me deu um chute por debaixo de meus pés, fazendo que o sapato velho que eu calçava, e que eu já o havia havia transformado em uma espécie de chinelo, pisando em suas bordas traseiras, fora empurrado para frente, com um chute dado por detrás,   ele caiu  há um metro de distância à minha frente.

Foi somente ai que notei que havia uma coisa de meus pertences que não haviam me tomado na cela, mas, que agora estava sendo requisitado por um outro preso, de outra cela e no horário do almoço. 

Pensei que era apenas uma brincadeira, e quando adiantei-me para calçar novamente o meu sapato, quem chutou disse que precisava dele. Mas, foi então que percebi que ali perto estava o Sinal, e notei-me protegido pela turma de nossa cela com os quais havia feito "amizade", e quem chutou, notou isso, e se afastou de mansinho. Permaneci com direito ao calçado. 

Mas, não demorou muito para eu ver que continuava vulnerável ali. Quando peguei a minha comida que já era pouca, uma espécie de polenta com um pouquinho do que poderia ser carne, notei que enquanto procurava um lugar para assentar-me ao  chão em um canto do pátio da central de policia, para comer o meu pirão, veio novamente por detrás de mim alguém que nunca soube quem foi foi, porque agiu tao rápido infiltrando-se no meio dos outros. Só notei o prato vazio.

Ele havia metido a mão no meu prato e roubado o que havia ali saindo rapidamente comendo e se escondendo entre as centenas de outros presos que estavam ali no pátio na hora do almoço.  Ali era inteiramente impossível, conseguir ser servido por duas vezes naquele lugar e por isso continuei com fome.

Na tarde, depois de voltarmos para  a cela, foi o momento de conhecer novos fatos e obter novas experiências terríveis. Durante o momento do almoço, contemplei alguns presos que não podiam caminhar normalmente, eles se arrastavam pelo piso, de joelhos ou se arrastando sentados ao chão, outros engatilhavam com os joelhos e cotovelos, pois não podiam se fixar nem com os pés, nem com as mãos, que estavam inchadas, inflamadas,  com feridas purulentas.

Então eu perguntei, para o Mãozinha, que era mais conversador e me dava mais atenção, ele também já havia-me contado sua história, sobre como entrou na vida do crime.

Ele falou-me sobre os motivos daqueles presos estarem se arrastando sobre o piso. Disse-me que aquilo era o efeito das palmatórias, uma espécie de cepo de madeira com um cabo, com o qual eles eram castigados nas mãos e nos pés para que  confessassem seus crimes. 

Os investigadores, batiam sem dó nem piedade, e os que resistiam em não entregar os outros, ou revelar seus crimes, sofriam muito mais. Mãozinha, me disse que toda quarta feira, era o dia em que os presos por ordem de chegada subiam para o lugar onde era feito o interrogatório, e onde haviam os espancamentos. 

Diziam-me ele que os gritos e gemidos eram ouvidos por todos durante as horas dos castigos. Mãozinha então lembrou-me que aquele dia era quarta feira,  e avisou-me que se eu não fosse chamado para subir e ser interrogado e apanhar, eu poderia ouvir os gritos dos presos que estavam sendo interrogados e espancados, e se eu fosse seria um dos que iria gritar.

Nesse momento, realmente, eu comecei a pensar em minha situação com mais atenção.   Eu estava ali inocentemente,  pois fui preso enquanto trabalhava de cobrador de ônibus em Belém.  

Um dos passageiros,  um senhor de uns 63 anos,  que viajava com sua esposa,  foi roubado dentro do ônibus em que eu prestava serviço, e como, segundo ele o fato aconteceu próximo da roleta, onde esta o cobrador, ele suspeitou que eu havia feito cobertura para a ação do bandido. Ele a vítima, era um sujeito do interior, um homem iletrado, com uma fala tipicamente caipira e muito engraçada, e quando notou que foi roubado fez um escândalo tremendo dentro do coletivo, inclusive perguntando  se alguma pessoa ali conhecia aquele ladrão, que havia descido pela porta traseira e saído em desembalada carreira. Quando a vítima perguntou se alguém conhecia o ladrão e onde ele morava,  muitos riram de sua insensatez ou mesmo estupidez em fazer tal pergunta, até mesmo eu ri, por ser uma pergunta tão ingênua ou mesmo idiota.   

Mas, o homem assaltado não gostou quando o povo riu,  e resolveu, achar um bode expiatório para a sua raiva de ser roubado no coletivo. Ele desceu uma ele anotou o número do ônibus, e denunciou à um policial de trânsito que havia ali, dizendo que eu era comparsa e havia acobertado o roubo. 

O meu ônibus continuou na linha conduzindo os passageiros, fomos até o final do trajeto e na e volta do coletivo quando chegou no mesmo lugar onde ele havia descido a vitima  entrou junto com um policial de transito, que mandou os passageiros descerem para esperar o coletivo seguinte, e  conduziu-nos à Central de Polícia.

Enquanto o veículo seguia para a central, de Policia em Belém, eu estava tranquilo, pois dizem que quem não deve, não teme. A vítima acusou-me inclusive de ter ficado rindo,  após ter consentido no roubo. E eu estava preparado para explicar-me e defender-me diante do delegado, para dar minha versão dos fatos.

Eu fiquei órfão de minha mãe aos 5 anos de idade, e perdi meu pai quando tinha apenas 14 anos, sozinho, já havia tentado trabalhar com tudo, que você possa imaginar que um menino pode fazer para a sua sobrevivência,  pois mesmo  com o meu pai vivo, ele porém, estava idoso e muito doente, diabético em estado grave,  até sua morte. Isso aconteceu, quando eu ainda tinha apenas 14 anos de idade e era quem cuidava dele, em seus momentos finais.  

Imagine, um menino de 14 sem pai e sem mãe no mundo, tinha que dar um jeito de sobreviver. Já haviam-me me dito que quando completasse 14 abes poderia obter a autorozação do Juizado de Menores para poder trabalhar, em um serviço fixo.

E exatamente assim eu fiz, no dia seguinte após completar de verdade os meus 14 anos, estava diante do Juiz de Menores, em Belém do Pará, para conseguir meu documento; 'Autorização para Trabalhar' de onde saí muito alegre diretamente para o Departamento de Trânsito, para mostrar que já poderia trabalhar de cobrador de ônibus, e assim poder ganhar meu sustento e alugar um próprio quarto onde poderia morar mais tranquilo, pois, vivia em casas de parentes, por ligeiros períodos de tempos,  em diferentes cidades.

Eu me adaptei muito bem, trabalhando na Transportadora Arsenal, meu dia todo era circulando pela cidade, nas ruas   Belém, na década de setenta. Alguns veículos eram bem antigos, e por algumas vezes,  as portas engatavam na hora de abrir, e a gente tinha rapidamente que  ir lá,  fazer força para que elas abrissem,  e outras vezes, tinha que força-las para que fechasse antes de prosseguir viagem

Depois do trabalho à noite, enquanto o motorista ia descansar e dormir. O cobrador era o responsável pela limpeza do ônibus, tendo que varrê-lo, lavá-lo usando balde com água,  limpar os vidros e todos bancos para o trabalho do dia seguinte. Durante uma ou duas vezes na semana havia exigência para  fazer o polimento no piso ou em outras partes.

Cada cobrador tinha que trabalhar, em um turno de 24 horas e  folgar outro período igual, para poder aguentar o ritmo de trabalho exigido. 

Eu porém, que tinha bastante saúde e energia da juventude,  e não tinha família ou outra responsabilidade que cuidar, solicitei para poder "virar trabalho", o termo usado para os que desejavam trabalhar seguidamente todos os dias. Geralmente, os que "viravam serviço" trabalhavam a semana toda e folgavam no Sábado e Domingo, para estar novamente na ativa a partir da segunda feira.

Enquanto estava sendo levado preso, eu pensava em tudo isso para explicar ao Delegado, que naquele ritmo de trabalho que eu estava levava, jamais tinha tempo ou pretensão  para roubar os outros,  me interessava muito ter o meu dinheiro mas, ganho de uma modo justo e com muito suor, afinal esse foi o grande legado e exemplo de vida que meu pai e minha mãe que era professora deixaram-me.

O vitima do roubo no Ônibus, também acusou-me diante do policial de trânsito que eu  fiquei rindo junto com alguns passageiros, após ele dizer que foi roubado.  Eu também estava preparado para explicar que o motivo do riso,  de todos foi a forma, engraçada como ele reagiu, na sua forma e voz de caboclo do interior paraense, com um sotaque grotesco dizendo aos gritos: "Minha gente, mé rubarom aqui,  eu tô rubado, eu fui rubado gente." 

Todos viram que numa arrancada anterior do ônibus, quando um homem de supetão impediu a porta traseira de fechar completamente e desceu  saindo em disparada,  mas todos imaginavam que ele havia tomado o ônibus errado, o que sempre acontece nas zonas urbanas de muito movimento. 

Mas, o momento mais cômico, foi quando a vítima suspeitando, que o moço que havia descido na disparada, era realmente o ladrão fugindo, perguntou assim: "Ó cubrador vucê num sabe adonde aquele ladrão que ali desceu mora?"  - Todos riram, e até eu ri também. Só podia ser uma piada, mas, o homem estava levando a serio. 

Bem, quando o ônibus finalmente chegou e eu fui conduzido bruscamente a presença do delegado de plantão, foi dada a palavra para que  vitima fizesse a sua acusação. 

Quando ele falou que eu  acobertei o ladrão, que ajudei que ele fugisse, abrindo a porta e que  ainda fiquei rindo disso. Eu não suportei e reagindo e disse-me:
 
 -  "O Sr. está está mentido, eu apenas estava realizando meu trabalho..."  

E quando eu ia esclarecer que  não é o cobrador, mas sim; o motorista que  mantém o controle das portas de um ônibus,  o delegado intervindo ordenou que eu me calasse, que ainda não era chagada a minha vez de falar. 

Então,  eu fiquei em silêncio e  esperançoso que a minha vez haveria de chegar para explicar toda essa situação na minha  minha versão dos fatos, se existia alguma que eu realmente detestava, era os 'batedores de carteiras' exatamente os assaltantes que agem dentro dos coletivos, eles roubam tanto os passageiros, como o próprio cobrador.  

Mas no final da explanação da vítima, o delegado apenas, olhou para o um dos policiais que estavam ali e disse: "Pode recolher o moço" - E ele prontamente pegando-me pela cintura, na parte detrás do cinto, levou-me no rumo das celas,   porém, tendo o cuidado de primeiro ficar com o que eu tinha no bolso conforme já expliquei.

E naquela, tarde, na prisão após o Mãozinha, me informar que era quarta-feira, "o dia do pau," como eles chamavam para a seção de tortura e espancamento do dia do interrogatório dos presos,  eu realmente percebi, que haveria de apanhar muito, para descobrir quem era aquele ladrão de carteiras, o qual eu nunca havia visto, e nem sequer naquele dia teria contemplado o seu rosto, o meu ônibus estava lotado.  

Mãozinha, ja havia contado-me a Historia dele, sentado ao meu lado no piso daquela nojenta cela. 

Eu já tinha imaginado, o porque do apelido, ele tinha o braço e a mão esquerda atrofiados, era menor que outro,   na sua mão atrofiada de nascença  não havia dedos, era apenas a palma de uma minúscula mão, com um formado diferente, que ele usava na almofada do carimbo, na hora de ser fichado e preso.

Mãozinha  contou-me, que havia nascido com aquele defeito vindo de uma família muito pobre. Quando cresceu tentou  trabalhar de alguma forma para ajudar sua mãe e seus irmãos menores, nas despesas de casa, mas, como não tinha estudos e nem podia fazer qualquer tipo de serviço devido sua deficiência, começou a comprar peixes nos barcos, para  vendê-los, na feira do Ver-O-Peso, o tradicional mercado livre de Belém do Pará.  Acontece que como ele não tinha licença para vender dentro do mercado, fazia como fazem muitos outros, colocava os peixes sobre uma caixa, para venda-los ao ar livre na rampa onde atracam as embarcações, e onde passa os transeuntes. O povo de baixa renda também, prefere, comprar os peixes sobre as caixas na pedra do Mercado do Ver-O-Peso porque é mais barato, ja que os vendedores não pagam imposto, nem aluguel. 

Mas, quando vinham os fiscais da Prefeitura, e eles eram apanhados, os fiscais para impedir a venda sem licença,  diziam  que os peixes estavam estragados e jogavam creolina, sobre os peixes, que então, tinham que ser jogados fora, gerando prejuízos para os seus vendedores, que os haviam comprados dos barcos geleiros. 

Então ele me disse que, vendo muita necessidade e impedido de trabalhar honestamente com a venda dos peixes, começou praticar pequenos furtos, que foram aumentando, com o passar dos anos. 

Ele contava-me ate com um certo orgulho sobre sua 'proeza'  pois, sentia-se era bastante habilidoso, ou corajoso, para entrar em qualquer residência e sair dela  com um aparelho de televisor na cabeça, ou qualquer outra coisa de valor,  sem ser notado. Também contou-me que aquela não era primeira vez que estava preso, e que também não seria sua última, pois, quando saísse dali, tinha que continuar roubando para poder sobreviver. E que matar ou morrer fazia parte da vida que lhe cabia viver.  Bem aquela era a sua história, mas eu estava preocupado era com a minha, e com a noite daquela quarta feira na  "hora do pau.

De repente,  naquela mesma tarde  Sinal, o prisioneiro que havia trocado a minha calça por cigarros, levantou-se de um supetão com um plano estrambólico que expôs aos outros presos de nossa cela, ele disse firme e zangado:

- Eu não aguento mais essa vida aqui dentro e vou dar um jeito de sair. Vou fingir que estou completamente louco, e quando estiverem me levando para o hospício eu aproveito e fujo.

Dizendo isso, comunicou ao carcereiro a necessidade de ir ao sanitário para fazer suas necessidades e saiu acompanhado para o rumo do sanitário, cujo vaso ficava no chão, e podia acumular excrementos. 

E quando voltou de lá, o vimos andando pelo pátio da central, todo lambuzado de fezes, por todo o seu corpo, rosto, cabelo, tronco e membros,  era como se ele estivesse ensaboado todo o corpo com as fezes sua e de outros presos. 

Nós observamos através das grades. Ele andava colocando os seus dois braços esticados para a frente e em passo lentos e diferentes do normal, ele simulava loucura. Chovia muito fora, no local, onde os presos haviam tomado sol pela manhã,  mas,  no pátio ele podia circular livremente, transvestido de louco.

Quando os guardas sentinelas notaram aquilo, e foram para cima dele com suas armas e baionetas empunhadas, ele temeu e tentando se defender correu imediatamente dos guardas, demostrando sobriedade e não loucura. 

Então os guardas percebendo que era uma farsa para tentativa de fuga,  o levaram para um canto, onde havia muita água de chuva caído dos telhados na prisão, então jogavam creolina nele, e com escovões  que eram usados para lavar piso,   esfregavam-lhe as costas, o rostos, e batiam nele com força para tirar-lhe as fezes. 

Depois dele mais ou menos ficar limpo, o levaram para uma cela isolada, como punição por seu atrevimento. 

Aquela situação também iria fazer parte da história do Sinal, que eu acabava de presenciar, ao vivo e a cores.

A culpa da minha detenção injusta, eu pensava que era do delegado, ou mesmo, do denunciante, que havia permitido eu chegar ali. Mas deixe que eu conte a minha história desde o começo. E esta realmente é a minha história que somente eu sei contar.

Eu havia conhecido o evangelho muito cedo, com apenas 10 anos de idade, cinco anos após a morte de minha mãe, que servia como professora, em uma cidade do interior do Pará, onde hoje existe uma pequena escola Municipal que leva o seu nome. 

Conheci o evangelho pleno, quando meu irmão mais velho e sua família se converteram, seguido por meu que pai também se converteu, e também eu os acompanhava à igreja, e reconheci que ali estava o caminho da verdade, mas, ainda não  havia feito minha decisão pessoal. Meu pai, após a morte de minha mãe, creio que perdeu a vontade de viver e por isso não tratou de sua saúde como devia. 

Minha mãe, que morreu inesperadamente aos 47 anos, quando contraiu tétano, enquanto feriu sua mão trabalhando em sua pequena horta no quintal de casa,  lidando com estrumes. 

Lembro deste dia, porque eu estava lhe 'ajudando', naquela tarefa. Ela pediu-me para que eu buscasse uma ferramenta, uma enxada, em um compartimento da casa, o que não encontrei, ela  forçava para fincar as estacas no solo, e enquanto fazia isso, entrou uma felpa da estaca de madeira em sua mão. Recordo que saiu muito sangue, e enquanto ela lavava para fazer o curativo, eu comecei a chorar, e perguntei-lhe se ela não ira morrer por causa daquilo. 

Ela abraçou-me carinhosamente, vendo meu medo e  inocência de uma criança que tem apenas cinco anos de idade,  e disse-me que aquilo não era nada, e logo estaria sarado. Passados alguns dias, ou quem sabe semanas ou meses não sei, ela começou e ter dificuldade de abrir a boca ao se alimentar, e sentir dores, que foram aumentando até surgir a necessidade, dela ser levada às pressas ao Hospital dos Servidores do Estado, a que tinha direito como professora estadual. 

Lembro-me inclusive, de seus seus últimos conselhos, dentro da ambulância, no pátio do Hospital, enquanto  esperava para ser levada adentro. 

Recomendava-me que ao ficasse na casa de meu irmão mais velho, que era localizada, no interior, em Curuçambaba, no Município de Bujarú, o lugar onde eu havia nascido,  na Beira do Rio Guamá, ou melhor, a casa onde meu irmão Carlos, que naquele época ja estava com 27 anos,  e tinha um pequeno comércio, que era do tipo palafitas, modalidade muita usada na região, de modo que ficava mesmo erguido sobre a margem do rio Guamá. Quando a maré enchia, as águas faziam maresia debaixo do assoalho da casa, onde com um balde e uma corda se tirava agua do rio para as necessidade de limpeza, como banho lavagem de roupas e utensílios domésticos. 

Por isso era grande  a preocupação de minha mãe para que eu sua ausência não  viesse à cair no rio e morrer afogado.

Nos dias seguintes, quando os médicos examinaram minha mãe, descobriram que o seu mal era tétano, e perguntando á sua família, se ela havia tido algum recente acidente, um pequeno golpe, minha irmã Carmem, recordou-se do acidente na horta, então o médico deduziu que foi por ali que o micróbio do tétano entrou. 

Enquanto minha mãe continuava internada para tratamento de saúde, eu ficava sob os cuidados de meu irmão e minha cunhada, já maiores, enquanto minha irmã e meu pai, acompanhavam minha mãe no Hospital.

Um dia, enquanto estávamos aguardando novas notícias,que vinha pelo rádio, veio a pior, que minha mãe havia falecido.

Meu irmão, que havia comprado uma canoa grande, e  trabalhava com venda de farinha, produzida na região de Bujarú, resolveu, mudar-se a cidade de Soure, no Marajó, onde havia melhores condições de escolas para as suas crianças que já estavam em idade escolar.

Após a morte de minha mãe, meu pai e eu deixamos de viver em Jambu-Açú, e fomos morar em Curuçambaba, onde meu irmão morava, meu pai, que tinha muitos amigos ali, comprou um pequeno local, no trapiche, onde encostava os barcos, onde montou também um pequeno comércio, onde vendia café e mercadorias aos viajantes que transitavam para viajar nos barcos daquele lugar.

Mas com a ida de meu irmão para Soure, nós fomos juntos, meu pai era um bom piloto de embarcação à vela, e com a canoa que meu irmão havia comprado, a "Fé em Deus" eles haveriam de morar em Soure, e trabalhar transportando farinha e verduras, de Bujarú, para o Marajó. E na volta levar as coisas que o Marajó produz, para vender em Belém ou em Bujarú. 

Mas, meu pai nem sabia que era diabético, e quando descobriu, sua doença já estava muito avançada, e logo piorou de modo a depender do apoio de meu irmão para moradia e meu apoio para cuidá-lo. 

Ele não fazia a dieta necessária, era muito teimoso e exagerava no açúcar e outras coisas que os diabéticos devem evitar. Quando ele sentiu que o fim se aproximava, ele me confidenciou que gostaria muito de partir, porém,  sabendo que eu estaria  firme na igreja servindo ao Senhor. E se aquilo realmente, era importante para ele, logo eu sabendo que sua situação era grave, fui na igreja e fiz minha decisão. O que o deixou muito contente.

Nos últimos meses, de vida de meu pai, quando sua situação piorou, eu dormia no mesmo quarto junto com ele,  pois ele tinha dificuldade de levantar-se para fazer as suas necessidades e precisava de meu auxílio. 

No Norte do Brasil, se usa muito dormir em redes, e a minha rede ficava bem ao lado da rede de meu pai.  Eu havia amarrado uma corda no punho de minha rede, e essa corda era colocada a sobre a rede de meu pai. para que na hora que ele precisasse de meu auxílio, apenas puxasse a corda, e assim eu acordava e levantava-me para servi-lo, evitando assim fazer barulho para  acordar outras pessoas que dormiam em outras dependências da casa.

Um dia ele puxou a a corda despertando-me pela madrugada, deveriam ser umas 3 ou 4 horas da manhã, eu lhe perguntei o que queria, e ele disse-me que queria apenas se despedir.

Informou-me que naquela noite ele tinha sofrido mais que as outras, eu tinha o maior prazer de servi-lo, porque a sua situação naquela época, causava muita pena, mas, eu  sabia que meu pai evitava ao máximo me ocupar, me acordar, porque eu era apenas um garoto, que haveria de completar 14 anos, e para tudo ele dependia de mim. 

Naquele momento ele me disse, nas palavras dele: 

- "Meu filho eu sei que de hoje eu não passo, porque as dores são insuportáveis, eu sinto que a minha vida está se apagando. mas, eu vou tranquilo, porque sei que você agora é crente, e vai servir Jesus. Nunca deixe este caminho. Jesus é maravilhoso. Sua voz estava pesada e pausada"

Eu jamais queria ouvir aquilo, e despistei, como sempre fazia. Eu disse-lhe:
- "Que nada pai, logo essa crise vai passar, o senhor vai melhorar, quem sabe até o senhor vai viver mais do que eu, e fica falando essas coisas" 

Ele respondeu-me:

-  Não filho só eu sei o que sinto. De hoje eu não passo"

Eu  fiquei em silêncio, sem saber o que dizer ou explicar em minha tristeza, na esperança que meu pai dormisse logo, para acordasse melhor. Mas, o peso do sono da madrugada, para  um garoto, que de vez em quando precisava interromper o sono, foi maior e eu também adormeci.

Pela manhã ao acordar fui logo a cozinha preparar o desejum de meu pai, eu também fazia tudo para não impedir, os momentos de sono que ele podia dormir.

Ao chegar com a sua caneca de café com leite,  e com suas torradas, observei que ele não havia se mexido da posição em que estava. Logo coloquei a mão em suas narinas e constatei que o meu querido pai não estava mais respirando. Meu havia partido com 68 anos de idade, e havia me deixado no mundo com  14.  Para nós a dor da separação, para ele o descanso de tanto sofrimento.

Mas, logo depois do enterro, eu precisava cuidar de minha vida. O clima na casa de meu irmão não estava muito bom para mim. Esse talvez, era o motivo de meu  pai desejar me ver bem crente servindo à Deus,  mais tranquilo, porque ele sabia como eu havia puxado a sua valentia e intrepidez do tempo de sua juventude, quando não tinha medo de nada, e afrontava quem aparecesse em seu caminho. 

No lugar em que minha mãe lecionava, houve um tempo que ele trabalhou como comissário de polícia, para colocar ordem no lugarejo, e ele realmente colocou. 

Os que o conheceram contam algumas histórias que não vale a pena colocar aqui, meu pai era um homem que só andava armado, e nunca levava desaforo para casa, gostava das coisas certas,  e por isso era respeitado por onde passava.

Creio que ele tinha medo que eu seguisse no mesmo ritmo, numa valentia que gera violência. Um dia enquanto saí para fazer alguma compra para ele mesmo, ele pediu que meu sobrinho, que tem quase a mesma idade que eu, trouxesse a sua caneca de leite. 

Meu pai não tomava leite com açúcar, mas, exigia que fosse colocado um pouquinho de sal, pois era seu costume antigo, fazer isso. 

Quando meu pai notou que meu sobrinho, não havia colocado sal, pediu-lhe que voltasse e colocasse uma pitada de sal, para dar o gosto em seu leite. Então creio que o meu sobrinho, que também era uma criança de  12 anos, com má vontade de fazer isso, ou quem sabe por não saber como fazer, ou descuido, colocou muito sal, de modo que quando meu pai foi tomar não conseguiu de tão salgado que estava o leite. 

Quando eu cheguei em casa, que meu pai contou-me o que havia sucedido e eu provei o leite que ele recusou tomar, para sentir como estava, e comprovei que estava impregnado de sal, isso me deixou com raiva, eu fui lá onde estava meu sobrinho, e dei-lhe um soco bem dado que ele saiu chorando, e voltando com minha cunhada, que veio tomar satisfação, defendendo o seu filho.

Eu já estava transpassado de raiva, e disse, para ele não encostar senão a coisa não iria prestar. Ela então ameaçou-me, que quando o meu irmão chegasse eu ia ver. 

Eu já conhecia o peso do cinturão de meu  irmão que enquanto eu era menor, desobedeci suas ordens, quando precisando de ter algum dinheiro, arrumei um trabalho de vender picolé, nas ruas de Soure,  e quando notei, ele estava a trás de mim pedindo eu que voltasse para casa. 

Chegando lá, diante de seus filhos deu-me um surra, que eu nunca tinha apanhado, nem antes nem depois,  senti que aquela foi a surra na minha vida. 

E naquele dia,  como eu já  sabia que a minha querida cunhada estando irada por eu ter batido no seu filho dela, iria fazer a cabeça de meu irmão para que ele me batesse novamente à vontade. 

Só que naquela época estando eu com 14 anos e sendo bem mais crescido que da vez anterior, não queria servir de exemplo de punição, pois, também observava que meu irmão maior andava muito distraído com seus negócios, e pouco se importava sobre os detalhes sobre o modo como o nosso pai estava sendo tratado, de modo que isso também estava me deixando fora dois trilhos. 

De modo que naquele dia que eu havia batido no seu filho e meu sobrinho, quando meu irmão Carlos, chegou para o almoço e  que sua esposa contou-lhe as novidade e eu o vi caminhar para o meu lado tirando o cinturão, eu escapei para o quintal onde havia, uma monte de estacas de madeira, onde seria construída uma cerca, e disse ao meu irmão pegando uma pedaço de madeira de acapu que substituía muito bem um taco de beisebol: "Pode vir, mas eu garanto que agora vai ser diferente,  eu cresci, tenho quase o seu tamanho, você não é meu pai, mas, meu irmão.  E  eu vou ensinar vocês a tratar bem o nosso pai que está ali dependente naquela rede, e eu contei-lhe sobre a história do sal no leite" -  Eu estava disposto a não deixar barato aquele momento, mas, meu irmão retrocedeu, e evitou o pior.  Não sei se para ele ou para mim, mas, possivelmente ei sairia na pior, porque  ainda um adolescente, querendo ser homem, e meu irmão já era um homem adulto e experiente, e foi exatamente por isso tirou por menos.

Portanto depois que o meu pai nos deixou, achei que não havia mais necessidade de eu permanecer a vivendo em Soure, na casa de meu irmão todo ano nascia um filho até completar nove, e eu tinha que tomar o meu próprio caminho. 

Chegando em Belém, eu tinha levado do Marajó uns queijos para vender, e dando boa venda, voltei ao Marajó, e levei mais, fazendo algumas viagens seguintes, para vender queijos, porém, em uma viagem, fui quase roubado por uns bandidos que disseram-me que sabiam de um comerciante que estava querendo comprar queijos e que eles estariam dispostos a me levar lá. Eles colocaram-me em um táxi, e saltamos em um lugar ermo no subúrbio da cidade, eles me conduziam por vielas e ruas estreitas, dizendo que estavam a procura de um tal comprador de quilos, logo percebi que estava em uma enrascada, eles queriam que eu lhes confiasse  a sacola com os queijos para eles sumiram, mas, eu dei um jeito e quem sumiu deles fui eu.

Logo depois disso, deixei dos queijos, e consegui um trabalho em um posto de gasolina,  onde fiquei fazendo pequenos serviços e tinha um lugar na casa da dona para dormir. 

Porém, o trabalho não deu certo ali, a mulher era muito boa e amável,   me tratava muito bem, mas, tinha um o filho que era um sujeito muito esquisito, ele tinha muitas condições, eu não tinha nada, era arrogante, orgulhoso, e me tratava muito mal, e fazia não sei se por perversidade ou prazer. 

Ele era bem maior que eu, devia ter os seus 25 anos, ou mais. Um dia nós estávamos sozinhos na casa, e ele aproveitou. Eu estava primeiramente, na sala, ele chegou e mandou-me ir para a cozinha, eu fui. Depois imediatamente ele chegou na cozinha e mandou-se ir para o quarto, e eu fui. Depois chegou no quarto e mandou-me ir para ouro lugar da casa. E eu não aguentei mais, porque senti que aquilo não ia parar facilmente. 

Então fui no quarto onde estava minha maleta de madeira, com as minhas coisas e sai com ela na cabeça, pelas ruas de Belém sem ter para onde ir. 

Para não dormir na rua, fui pedir guarida na casa de uma tia minha, que permitiu eu ficar ali por um certo tempo.  Mas, apesar de minha tia e minha prima de maior de idade, terem boas condições, pois o meu tio que era irmão de meu pai, tinha deixado um comércio e muitas propriedades, casas que eles alugavam, e me trataram muito bem ali, também  não foi possível ficar, porque  a casa estava cheia de adolescentes, visto que uma outra minha prima e seu esposo haviam falecidos, e deixado cinco crianças para eles criarem, e tinha um deles, maior e mais velho que eu, que talvez não gostava que eu estivesse ali, algumas vezes a gente brigava, e como ele era bem maior e mais forte que eu, sempre eu levava a pior. 


Foi por isso que quando obtive a autorização do juizado, para trabalhar de cobrador de ônibus, senti-me liberto, pois poderia viver por conta própria,  e fui morar em um quarto que aluguei próximo à garagem da empresa de ônibus que eu trabalhava.

Eu de fato tendo minha liberdade de morar e viver sozinho, trabalhava muito, durante os dias de semana, mas, tendo os finais de semana livre, comecei a fazer amizades com outros colegas na empresa, e aprendi a fumar, a beber, a jogar e me divertir de um modo dissoluto, sem nenhum compromisso com Deus, durante os três anos seguintes. O dinheiro que eu ganhava trabalhando dobrado durante as semana, era extraviado nas bebidas e no jogos durante o final de semana.

Nesse período, via os outros fumarem maconha durante a noite, enquanto  limpavam os ônibus, e eu tinha um colega, que me informou que a maconha servia como um estimulante, que dava forças durante o trabalho da noite. 

E eu findei experimentando, por uma duas ou três, vezes, mas em mim causou um efeito raro, eu fiquei engraçado e qualquer coisa me fazia rir, com muito facilidade e alto, como se estivesse dando-me um ataque de riso. Notei-me ridículo fazendo isso, e parei imediatamente, já bastava o álcool, que eu consumia e sabia controlar melhor.

E naquele dia no cárcere diante das informações que o Mãozinha me passava sobre o "dia do pau" que poderia ser o meu dia de interrogatório, vinha em meu o pensamento as imagens dos presos se arrastando no pátio da prisão, por terem suas mãos e pés inutilizados de tanto apanharem ali, fiquei preocupado com poderia ocorrer quando chegasse a minha vez de apanhar; realmente eu estava preparando-me para apanhar  eu era penas um jovem de 17 anos de idade, que estava despontando para a experiência da vida.

Foi então que separei-me das conversas com outros presos, recolhi-me para um canto, onde me posicionei de cócoras, coloquei minha cabeça entre as pernas e comecei a orar bem baixinho.

Pode parecer simples, mas, foi a oração mais importante que fiz em toda a minha vida, eu disse assim: 

"Deus, se tu realmente existe, tira-me daqui, e eu vou te servir até o restante de minha vida" - Eu estava sendo sincero, igual Jonas quando orou no ventre do peixe.


Jonas também escapou fedendo. O que aconteceu depois desta oração você saberá no capitulo seguinte.


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